sábado, 31 de maio de 2014

A voz do coração

Cof!! Coff!!
Deve ser a poeira..depois de tanto tempo aqui encostadinho, só tinha mesmo que ficar assim não é mesmo? rs..mas cá estou eu mais uma vez...pra contar tudo o que fiquei devendo nas postagens anteriores.
Confesso que ando sem ânimo, motivação pra escrever no blog..mas não se preocupem, não é depressão, nem nada ruim..é (não espalhem, tah?) preguiça mesmo rs.
A verdade é que o Blog é um canal não so de informações que tento compartilhar com aqueles que foram escolhidos pra viver neste campo de batalha sem nenhum treinamento, é meu "querido diário"..e acho que já desabafei o suficiente. Mas fica a dica pras mamães que ainda não fizeram isso: ESCREVAM! se não podemos gritar, não podemos chorar, não podemos xingar quem queremos chingar com todas as razões do mundo...podemos escrever e esperar que os bons entendedores percebam os "ís" nos pingos. Garanto, faz um bem danado..principalmente quando alguém vem e diz que entende tudo o que você esta sentindo, ou que se sente igual...faz bem não se sentir único na guerra e saber que temos irmãos na luta.

Mas vamos ao que interessa..não foi isso que vim dizer, ou não só isso.

Hoje vim mais uma vez falar sobre a traqueostomia (o grande bicho de 7 cabeças que tanto tememos).

Quando decidi fazer a traqueo do Angelo, sabia que se não fosse naquele momento pelo motivo que foi, seria mais tarde por outros motivos. Isso não é falta de fé, mas lógica. Para todos os cristãos (saibam que também sou), acredito na cura, no milagre e na manifestação da glória de Deus, mas acredito também que para tudo ha um propósito e tempo...portanto saber esperar e entender o tempo do Senhor é também um exercício de fé.
Mas voltando a lógica..Angelo estava com o pulmão ok, sem pneumonia, limpinho como talvez ha muito o tempo não o via. Entretanto não conseguia sair do tubo, e a duvida não era so minha mas também da equipe médica, PORQUÊ?
A resposta veio da neurocirurgia, que por consequência da patologia do Angelo, havia um desgaste do tronco cerebral, causado pelo cisto (corpo caloso) que movimenta pressionando o tronco e prejudicando as funções respiratórias. Além disso tínhamos que contar com a má formação do tronco, afinal muito antes de tudo isso nosso Anjo ja sofria de apneia central, lembra?
Essa resposta veio de três neurocirurgiões diferentes, dois de nossa cidade (que são de equipes e técnicas de trabalho diferentes) e de um neurocirurgião do hospital pequeno príncipe que nos disse que nada havia a ser feito cirurgicamente la que já não tivesse sendo feito aqui, quando cogitamos a transferência. Por esta razão, a traqueo era necessária para o Angelo poder evoluir (sair da uti e retomar as terapias em home care). 
Ai você pergunta? ahh mas e se tivesse esperado o cisto movimentar, o Angelo conseguiria sair do tubo?
Talvez sim..pouco antes dele fazer a traqueo, um destes neuros nos disse que o cisto havia movimentado e que a hidro reduzido. Mas ja se faziam mais tempo que o Ângelo tava entubado que o protocolo manda, para que seja feita a traqueostomia. E protelar isso, podia gerar a um edema de glote, a uma fistula, dentre outras lesões graves da traqueia.

Pois bem, a traqueostomia aconteceu e como superar este momento?

A primeira coisa que se deve entender quando a criança passa por este processo é que ninguém fará isso para machuca-la ou porque quer que ela seja dependente de respirador, mas sim porque quer dar a ela uma chance a mais, um tempo a mais..que sem a tecnologia talvez não fosse possível( exceto por um milagre que sabemos requer muita fé e oração). E foi isto o que senti quando pedi para a médica traqueostomizar o Angelo. Ver meu filho sofrendo para respirar e só ficar bem quando estava entubado (que diga-se de passagem não me parece confortável ter uma "mangueira"atravessando suas vias respiratórias e uma penca de esparadrapos colados em seu rosto ferindo sua pele), era algo mais assustador do que imagina-lo preso a (dizendo a grosso modo") um cano para respirar permanentemente e uma penca de aparelhagem. Não é bonito? não..não é! não é o ideal de uma mãe imaginar seu filho com uma "coleira" no pescoço para o resto da vida...e preso a um respirador, mas é o ideal de uma mãe ter seu filho vivo e ter um tempo a mais para buscar a cura, buscar recursos melhores.
Alem disso busquei videos na internet e casos de sucesso de crianças que conseguiram evoluir a tal ponto de se livrarem da traqueostomia, isso foi motivador! Conheci inclusive uma vizinha do meu bairro, que ficou traqueostomizada por 10 anos e hoje vive e respira normalmente.

E foi nisso que me agarrei e decidi que meu filho precisava de algo melhor que ficar numa UTI sendo entubado e extubado, e machucado varias vezes.

Por fim, fomos pra casa com um respirador e meu filho vivo, e maravilha! Missão cumprida!

Dada esta vitória, tínhamos outros medos e traumas para enfrentar pela frente. Muitas coisas a aprender, tais como: aspirar a tráqueo, trocar o cadarço, manipular o respirador. Algo que não se aprende do dia para a noite, e não é nada fácil depois de enfrentar noites e dias traiçoeiros na uti e ver que a pessoa mais importante da sua vida estava por um fio. Tudo o que se quer e esquecer esses momentos, mas a nova rotina me fazia recordar terrivelmente!

O SILÊNCIO


O primeiro sinal de que tudo é diferente, é o SILÊNCIO!
Que silêncio? você deve se perguntar! Com tanto aparelho, alarmes etc..como pode haver silêncio? 
Nãao, não este silêncio. O Silêncio do canto do passarinho, do meu passarinho, meu pequeno Anjo!
Anjo nunca falou, mas emitia alguns sons que (verdade ou não) me sugeriam algumas palavras: ãe (mãe), aiii (quando reclamava ou sentia dor) e vogais A-E-O (I e U ele não conseguia falar talvez pela fonética ser mais fechada). Eu adorava coloca-lo em sua cadeirinha no sol todas as manhãs, ligar o rádio e ouvi-lo cantar. Ele cantava e se balançava  e "ai" do som se parasse, o canto virava choro e birra rapidinho.
Com a traqueostomia o ar não passa pelas cordas vocais, o que inibi qualquer emissão de som.
Devido ao tempo que ele ficou sedado e ao trauma da entubação,  a musculatura facial também sofreu perdas, e ele quase não tinha expressões faciais quando voltamos pra casa. Tinha o rosto como de um boneco de plástico de tantos corticoides que tomou. Sem som e expressão, era um quebra-cabeças entender o que ele estava sentindo e assim poder ajuda-lo.
Quando estávamos em casa e eu ouvia o som do aspirador, era algo "PERTUBADOR" por vezes ajudava as técnicas a aspirar, e depois corria pro banheiro pra chorar, pois toda aquela situação da UTI vinha como uma avalanche na minha memória: o Angelo sendo entubado, ele sofrendo...argg!
O fisio chegava pra trabalhar e enquanto faziam fisioterapia motora eu acompanhava, quando se preparavam para aspirar, eu arrumava uma desculpa qualquer e corria pra cozinha, pro quarto, pra lavanderia..pra qualquer lugar! Depois era invadida por um imenso sentimento de culpa, de pensar que meu filho estava passando por isso "sozinho" porque a mãe dele não estava la com ele!
Essa situação durou meses, posso dizer quase ano. E nesse quase ano, obviamente houveram outras internações e assim sendo, tive que aprender a dominar este sentimento. 
Tamanho era o trauma, que eu não conseguia (e ate hoje me incomoda) passar perto do hospital, ou ir até la quando algum amigo ou parente estava internado. Prometi visitas a muitas colegas de uti que não consegui cumprir, pois chegava na porta do hospital e o desespero me agarrava pelas pernas e eu voltava pra casa, chorando, naturalmente! 
Enfim, aprendi a aspirar, a calçar as luvas (que é a parte mais difícil do procedimento) e aos poucos fui dominando meu medo. Entretanto, ate hoje só o faço quando não tenho quem faça. Sei de mães que preferem aspirar seus filhos e que as vezes ate proíbem os profissionais de faze-lo pois não confiam que os outros terão o mesmo cuidado. No entanto, sou meio as aveças rs...Prefiro que outro o faça, e claro sempre peço com jeitinho quando quero que seja diferente em alguma técnica, mas ainda assim prefiro que seja o profissional...pois ainda tenho pra mim, que parece que vou machucar meu pequeno, e so quero que ele sinta que estou ali para dar força a ele e não para machuca-lo. Certo ou errado?.ja dizia Chicó...




Primeira lição, ok!
Ai veio o segundo passo: trocar cadarço.
O medo desesperador da cânula sair era algo que me incomodava, pois sempre ouvimos na uti: se sair o orifício fecha quase instantaneamente e pode não dar pra recolocar e então irá a óbito. E sim, isso é verdade! o tecido da traqueia pode colabar, colar, unir-se como se nunca tivesse aberto, rapidamente. Por isso alem de trocar o cadarço, tive também que aprender a tomar uma atitude se acontecesse da cânula sair. E se isso aconteceu? haa...só umas três ou quatro vezes seguidas! e dessas ao menos 2 foi eu quem recolocou e confesso que em uma delas, foi quase impossível..mas a mão de Deus, estava lá e me ajudou (pois houve uma grande resistência na hora de inserir novamente).
A troca do cadarço não é algo que aprendemos no hospital. Mas aprendi em casa com as técnicas de enfermagem da home care. Elas faziam eu via, dava uma ou outra opinião, ajudava segurando ou fazendo curativo, mas eu era uma mera assistente. Ate que um dia uma enfermeira assumiu o plantão. A troca do cadarço sempre fazemos na hora do banho, contudo quando a criança saliva ou sua muito, é necessário fazer varias vezes para manter a região do pescoço seca e limpa, evita proliferação de bactérias, infecções e também mantem o bem estar da criança.
Quando esta enfermeira assumiu o plantão, eu disse a ela que tinha que trocar o cadarço dele antes de dormir porque ficava molhado de saliva, ela virou e disse-me: "Ihh Adriana eu não sei trocar isso não, nunca fiz e nem gosto de mexer porque meus pacientes eu nunca mexo porque sou enfermeira da noite e quem faz isso são as enfermeiras do dia". Olhei chocada e pensei: "ãh, quê? alguem pór favor corre na grade curricular das faculdades de enfermagem e descobre porque não tem essa disciplina pras enfermeiras da NOITE e porque  existe distinção de enfermeiras para dia e noite? isso vem no diploma?"
Minha resposta foi: olha eu também não sei trocar, então vamos aprender juntas, pois não tenho prática!
A verdade é que eu morria de medo e também nunca havia me empenhado a aprender, só queria evitar situações que me remetessem ao trauma da uti, o que eu não sabia é que essa era minha realidade, a realidade do meu Anjo e sim eu tinha que aprender a lidar com isso. E foi assim que aprendi! Quando ninguém fez por mim, quando me obriguei a dar o melhor pro meu filho. Sim eu tinha opção: ignorar e dizer tal como a enfermeira "não sei e não quero aprender"e ver meu filho sofrer com assaduras, ou simplesmente vestir a armadura e dizer: é hora de aprender!
A partir de então comecei a fazer a troca do cadarço, e ao invés de auxiliar as técnicas de enfermagem, eu as fazia me auxiliar e orientar ate que aprendesse totalmente. E hoje posso dizer que ja sou "crack" ahaha.
As vezes no hospital troco sozinha, quando Anjo esta dormindo, calmo. Mas o ideal é ter sempre alguém por perto para o imprevisto da "canula sair".
Maas..voltando ao assunto! O tempo passou, com fonoterapia, fisio e terapia ocupacional as expressões faciais do Angelo voltaram! (oba!) e ele aprendeu a controlar o ar de modo que as vezes solta ate uns gritos. Quando a cânula fica um pouco folgada (que é quando não tem o cuff ou popular balonete) tem um certo escape do ar pela boca e ele tira um proveito disso resmungando e cantando.
Entretanto conheci pacientes traqueostomizados que falam, claro que o som não é tão alto e claro, mas é possível conversar com eles numa boa e compreender o que dizem tranquilamente. É o caso do Léo, um garotinho muito esperto que também é paciente de home care, é traqueostomizado, usa respirador mas come e fala de tudo! somos amigos de face kkk e ja ate visitei meu amiguinho fanzão do Bem 10!

Hoje meu passarinho as vezes canta baixinho, mas vê-lo feliz, sorrindo, assistindo seus dvds, brincando aos montes nas terapias e ate comendo danoninhos e papinhas durante a fonoterapia, é pra mim como ouvir sinos, cristais a soar.
Ainda acredito que o verei chamar com todas as letras "mamãe" e então...não existirá musica mais perfeita aos meus ouvidos. Mas ate la, ouço o som do seu coração que fala junto ao meu, e somos felizes assim!











2 comentários:

Bianca disse...

Parabéns Adriana, pela força e determinação... Que Deus continue derramando muitas bênçãos sobre vcs, e te dando ainda mais forças nessa caminhada.O Anjo é lindo d++.
bjoss.. Felicidades.

drika disse...

Obrigada Bianca. abraços =)