20 dias se passaram da colocação da Válvula de DVP, e tudo parecia ir muito bem obrigada. Os médicos falavam em alta, ou uma possível saída da UTI para o apartamento. Ângelo fazia sessões de fonoaudiologia e ja estava alternando a dieta: uma na sonda orogástrica (sonda via oral) outra por mamadeira, alternadas a cada 3 horas.
GRANDE ILUSÃO: ESTAVA APENAS COMEÇANDO!
Como se cogitava a alta hospitalar, as pediatras responsáveis pelo acompanhamento de Anjo na UTI, queriam transferir-nos para um apartamento de internação, a fim de que eu me habituasse a cuidar dele sozinha sem a ajuda das técnicas (embora ja soubessem que eu o fazia , ao fato que passava dias e noites ao lado do berço no isolamento onde estava meu pequeno.
Para melhor entender, vou explicar como era distribuída a UTI Neo do HGU.
RISCO I : Casos considerados mais graves com risco de morte. Geralmente crianças que nascem prematuras, com órgãos mal formados, ou com problemas oriundos de partos mal sucedidos.
RISCO II: Crianças que saíram do RISCO I, que ficam em observação, com condições de respirar em ar ambiente, porém com ainda risco de morte.
RISCO III: Crianças que apenas precisam atingir o peso ideal com dieta via oral seja por mamadeira ou leite materno, que já passaram pelos tratamentos de RISCO I e II, e não possuem risco de morte. Unica parte também em que a mãe é obrigada a ficar com o filho em tempo integral (outra hora aprofundarei mais no assunto).
ISOLAMENTOS: Eram duas pequenas salas, normalmente usada para crianças com doenças contagiosas, ou em estado gravíssimo que precisavam de observação maior.
Angelo Gabriel ficou aproximadamente 1 mês e meio na incubadora do Risco I, depois como não mais cabia na incubadora, foi transferido para o isolamento, para um pequeno berço.
Segundo as enfermeiras eu era uma mãe diferente, pois comumente as mães do RISCO I não participavam muito da vida de seus filhos, até porque mal podíamos toca-los na incubadora. Mas eu fazia questão de segurar a seringa por onde passava a dieta do meu pequeno, e aprendi passar medicação em sonda, ajudar nos curativos. Já que não podia ser mãe me tornei "enfermeira", mas fiz de alguma forma meu papel.
Deste modo, fazia tudo quase que sozinha, apenas tinha auxilio das técnicas de enfermagem, algumas até abusavam deixando seu trabalho para mim, coisas que talvez eu não devesse fazer como anotações nas folhas de enfermagem.
Mas voltando ao assunto, concluiu então a pediatra: seriamos transferidos.E assim aconteceu!
Passaram as festas de fim de ano (que para mim não tiveram nada de festivas!) e uma semana depois do reveillon fomos para um apartamento do hospital.
Eu tinha medo e ansiedade ao mesmo tempo. Ansiedade por finalmente ter direito a cuidar do meu filho e a decidir sobre sua vida, sobre tudo o que precisava. E medo por não ser capaz, ou de ser cedo demais para isto.
Os primeiros dias foram extremamente exaustivos, pois todos estavam aguardando por conhece-lo o que era impossível enquanto estávamos na UTI, afinal somente os pais e os avós podiam entrar no recinto.
Parentes e amigos foram conhecer Angelo, e eu respondia todas as vezes as duvidas e indagações das pessoas sobre o que ele tinha, o que seria dele, qual seu destino??????????????????????????
Estava cheia de duvidas! cheia de medos! eu NADA sabia sobre o futuro do meu filho, mas eu me fazia otimista e simpática, para não ver desespero ou olhares de pena sobre nós.
Foi então que o pesadelo começou.
Não me sentia segura (até porque tinha fundamento para isso) em deixar Angelo sem oxímetro de pulso (aparelho que mede o nível de oxigenação no sangue e a pulsação cardíaca), pois Anjo fazia apneia (parada respiratória) e quedas de saturação constantes (também falarei sobre isso num outro tópico).
Os oxímetros que tinham disponíveis no andar ou eram pediátricos ou de adultos e os aparelhos eram deveras antigos e cheios de problemas, as vezes demoravam em media 30 segundos pra me dar retorno de um evento de apneia. Em cada evento de apneia Biel precisava de estímulos táteis na região do diafragma a fim de estimular o movimento respiratório. Entretanto quando o oxímetro me dava essa informação o episódio em questão ja havia terminado, ou seja, meu filho passava por momentos de ANÓXIA (falta de oxigenação no cérebro).
A noite eu não conseguia dormir, passava a noite observando seu peito para perceber quando parava de respirar já que o oxímetro parava. Algumas vezes pude cochilar quando emprestava algum oxímetro da UTI NEO, mas sempre pegavam-no de volta, uma vez que o hospital é setorizado e os equipamentos são de responsabilidade do setor a que pertencem.
Ainda assim não eram muito agradáveis as noites la, sendo que a cada duas horas o bebe tinha alguma medicação e as técnicas entravam sem nenhum cuidado ou respeito (não generalizarei pois tiveram poucas muito cuidadosas, quão profissionais e humanas foram!).
A rotina era: banho pela manhã, visita medica, medicações, e tudo se repetia a cada turno. Eu observava pela janela que me dava a visão da avenida da prainha, e pensava quando finalmente sairíamos do cárcere.
UM mês ficamos ali e as médicas falavam em alta hospitalar novamente, com o intuito de mantermos uma UTI móvel em casa, ou como chamada HOME CARE (cuidados domiciliares).
Até que Anjo apresentou uma regressão e piora no seu quadro. As apneias ficaram mais longas e ele chorava o dia todo,quase não dormia mais, meus braços ficavam dormentes de tanto segurá-lo. Eu passeava pelo corredor do hospital, para sair um pouco do quarto, e todos ficavam incomodados com seu choro mas nada faziam para me ajudar acalma-lo.
Quando se aproximava das 6 da tarde eu não mais aguentava, e por muitas vezes ligava chorando para minha mãe pedindo ajuda ou para minhas irmãs, infelizmente não podiam me ajudar na maioria das vezes. Ligava pro Rafael (pai), mas ele estava fazendo horas extras (não opcionais) no trabalho para compensar as faltas que teve desde que o bebê nasceu.
Ao chegar as 19 horas Anjo sempre dormia, um sono que era de exaustão. Conhecem algum bebê de dois meses que passa o dia todo acordado? Logo o horário de dormir passou a ser depois das 9 da noite e foi ficando cada vez mais tarde.
A alteração no quadro respiratório e no sono dele veio seguido de episodios de vômitos. Por sorte neste dia a madrinha dele a Angélica (também minha sobrinha) estava comigo pois havia sido demitida do trabalho (acho que foi Deus quem permitiu para que eu tivesse ajuda, e ela passou a me visitar todos os dias, foi uma benção para mim) foi quando a deixei cuidando de tudo e corri com anjo nos braços para a UTI, suas apneias eram tão fortes que ele chorava então desmaiava durante o episodio de apneia, e em seguida voltava ao choro de onde parou.
Na porta da UTI pedi para entrar e disse que de la não saía até conseguir. A enfermeira disse que não podia, mas a pediatra disse que estava me esperando, e que deixou o isolamento vazio porque sabia que eu ia voltar. Acredito que ela não pensava na causa do retorno, mas pensava que eu não estava dando conta do recado.
DE VOLTA A UTI, novamente no isolamento, uma das técnicas comentou: A CABEÇA DELE CRESCEU!
Falei que era impressão dela e não aceitei a hipotese. Logo ela saiu, e quando outra técnica entrou disse exatamente a mesma coisa. Comecei a juntar as peças do quebra cabeças, tudo o que estava acontecendo e concluí: a válvula estava obstruída.
Chamei a pediatra plantonista e ela não aceitou também a suposição. Mas insisti até que ela pegou a fita métrica pra me provar e foi quando infelizmente se provou o contrário. Na ultima medida antes de ir pro apartamento a cabeça tinha 46 cm de diametro e naquele momento apresentava 48,5.
Foi então um rebuliço na UTI em como este fato se deixou passar despercebido. Tentaram falar com o Neurocirurgião que colocou a válvula, ele porém não atendeu o celular, ela ligou insistentemente e ele não atendeu. Coincidentemente naquele dia, um outro neurocirurgião estava de passagem no hospital e foi chamado para avaliar e ele diagnosticou a obstrução da válvula. Pediram que ele entrasse em contato com o dito neuro que operou o Anjo e no primeiro toque foi atendido, enquanto que as pediatras tentaram o dia todo falar com ele e não conseguiam, talvez porque viam que era o numero do hospital. Ele era mesmo um "estrelinha" como elas mesmas chamavam, tanto era que para conseguir informações sobre o procedimento cirurgico tivemos que marcar consulta em seu consultório particular. Pasmem!
ENFIM marcaram as pressas uma TOMOGRAFIA, Biel entrava naquele momento em regime de JEJUM, para a tal tomografia, contudo o dia sguinte era um sábado e ele não conseguiu realizar a TOMO porque o "estrela" não se dispos a acompanhar o exame no fim de semana, e o procedimento foi realizado somente na segunda feira demanhã.
Na manhã de segunda portanto, o exame aconteceu e eu aguardava pelas respostas do tal especialista. Entretanto para meu azar, enquanto fui comprar um lanche ele fez a visita ao bebe e assim redigiu em seu prontuário: VÁLVULA FUNCIONANTE. ALTA E ACOMPANHAMENTO COM PEDIATRA!
Não acreditei quando vi, pois a pediatra fez questão de me mostrar e tentar me convencer do fato. Eu finalmente desci do salto. Estava exausta. Não aguentava mais ver meu filho sofrer, evidentemente seu choro era de dor de cabeça. A pressão intracraniana era cada vez maior!
Voltamos para o apartamento ( não era tao seguro mas pelo menos eu não precisava dormir em cadeira). E passamos a medir a cabeça dele todos os dias até arrumarmos outro neurocirurgião.
E desde este episodio se passou um mês. Finalmente conseguimos o especialista dr Roger (este faço questão de citar). Ele prontamente examinou o bebe e em seguida marcou sua cirurgia. Entretanto não poderia ser no HGU pois o Angelo (agora com 3 meses) precisaria de uma UTI pediatrica enquanto que a do hospital geral era somente neonatal.
Anjo recebeu alta para ser reinternado no hospital Jardim Cuiabá, foram 3 dias de internação ate a cirurgia. Neste momento sua cabeça ja tinha 52cm de diâmetro. Eu não suportava carrega-lo por causa do peso da cabeça e não via a hora tanto quanto ele (acredito) daquele pesadelo chegar ao fim.
A cirurgia aconteceu e foi um SUCÉSSO. Um mês depois recebemos a alta hospitalar em regime de Home Care e assim estamos, mas nada melhor que ver a expressão de alivio no semblante de um pequeno anjo.